Por Danilo Monlevade*
No dia 22 de novembro de 1942 os leitores do jornal O Estado de Mato Grosso viram um recorte com o convite para a festa em homenagem à Santa Cecília, a padroeira dos músicos, que seria realizada na residência do Mestre Inácio, reconhecido músico e líder comunitário em Cuiabá, morador do bairro do Baú. 
Muito embora estabelecido na cidade desde o início da ocupação da região próxima às lavras do Sutil, o Baú era para a população cuiabana um bairro, mas não era tido desta forma sob o aspecto legal. Essa legalidade só veio a ocorrer em fins da década de 1980, com a iniciativa da Câmara Municipal de Cuiabá, na pessoa do vereador Luiz Estevão Torquato da Silva. Diante da mobilização dos moradores do não reconhecido bairro, que não se identificavam e não se sentiam moradores da Lixeira ou Araés, clamaram pela oficialização do bairro do Baú. 
Antes de discorrer sobre o processo de efetivação legal do bairro, vale apresentar alguns aspectos do Baú. Dizem que o seu nome originou-se de uma pepita de ouro em forma de baú, que teria sido encontrada por bandeirantes às margens do córrego da Prainha. Tese essa que não admitida oficialmente. Sabe-se também que o Baú era um bairro boêmio no século passado, morada de ilustres cuiabanos, como o Mestre Inácio. Antes porém, no período colonial, era a periferia dos segregados, principalmente de escravos. As suas ruas são tortuosas e com relevo acidentado, em um ponto elevado da cidade, tendo atualmente os bairros da Lixeira, Centro, Bosque da Saúde e Araés como vizinhos. 
Para esse artigo entrevistei o ex-vereador (1983-92) e ex-Presidente da Câmara (1987-88) Luiz Estevão Torquato da Silva para relembrar o projeto que apresentou em 1987. Com a cópia do projeto em mãos, o ex-vereador afirmou que apresentou o Projeto de Lei para a nova denominação do bairro da capital, o bairro do Baú, em novembro de 1987. Na redação do tal Projeto de Lei, o vereador inseriu a palavra tradicional, pois entendia ser aquele um local intimamente ligado ao processo histórico e de evolução da cidade. Estaria o tradicional Baú, conforme Torquato, abafado pelos bairros da Lixeira e Araés, e os seus moradores clamavam pela oficialização do bairro do Baú.
Segundo o apresentado na Justificativa do Projeto de Lei, com a efetiva e legal denominação de bairro do Baú, o parlamento municipal cuiabano estaria respeitando a força da cuiabania, e então, na Sessão Ordinária do dia 24 de novembro de 1987, foi aprovado o projeto. Na Sessão o vereador Wilson Coutinho cumprimentou o seu autor, afirmando que o vereador Torquato demonstrava espírito de cuiabanidade, atendendo a uma reivindicação dos moradores do bairro. 
O trâmite entre a aprovação no parlamento à sanção pelo Executivo esbarrou na interpretação contrária do Prefeito Dante Martins de Oliveira. Este, discordando do conteúdo do projeto, alegando omissões, desconformidades e erros, vetou integralmente o Projeto de Lei e o devolveu aos vereadores em 16 de dezembro de 1987. A celeuma pairava principalmente no limite do Baú com o bairro Araés. Para o autor do Projeto de Lei, os limites do novo bairro che- gavam até a rua Desembargador José de Mesquita, descendo até a avenida Mato Grosso, enquanto a Prefeitura entendia que o limite com o bairro do Araés era a avenida Historiador Rubens de Mendonça. 
Após o recesso parlamentar o veto foi analisado pelos vereadores e, por unanimidade, rejeitado, sendo em seguida promulgada pela Câmara a Lei Municipal nº 2.830/88, acolhendo o descrito no original apresentado pelo vereador e então Presidente da Câmara Municipal de Cuiabá, o Sr. Luiz Estevão Torquato da Silva. Quase 10 anos depois, o Prefeito Roberto França deu novos limites ao bairro do Baú. Com a Lei Municipal nº 3.709/97, foram estabelecidos os limites do Baú com o Araés, fazendo uso da avenida Historiador Rubens de Mendonça como artéria de divisão. 
Esse recorte histórico traz um aspecto de grande importância, que é contínuo acolhimento pelo parlamento cuiabano das demandas da comunidade. O movimento popular, dos moradores do bairro do Baú, fez com que os vereadores reconhecessem que aqueles moradores em nada se identificavam com os bairros da Lixeira e Araés. Fez-se portanto, justiça ao longínquo e tradicional bairro do Baú.
Fontes: Livro Ata nº 134 Arquivo/CMC 
Entrevista com Luiz Estevão Torquato da Silva em 29/11/2023
O Estado de Mato Grosso – Ed. 864 – 22/11/1942 
*Danilo Monlevade é analista legislativo – Câmara Municipal de Cuiabá
Fonte: Câmara de Cuiabá – MT